quarta-feira, 28 de julho de 2010

POR UM FIO

Além de figurinha conhecida na programação do Fantástico, Rede Globo, o médico Drauzio Varella é também dono de um texto enxuto e agradável. Assim como em suas matérias para a televisão, ao escrever ele também parece ter o dom de simplificar questões complicadas. Esse é o tom de “Por um fio” (Companhia das Letras, 2004, 218 páginas), onde Drauzio reflete sobre o impacto da convivência com a dor e com a perspectiva da morte, através da observação do comportamento de pacientes e de seus familiares. Especialista em oncologia, sua narrativa passeia por 30 anos de convivência com o câncer, terminando com a emocionante história da doença do seu irmão, médico e seu companheiro de trabalho, também acometido com a doença que tanto combateu. Drauzio Varella convive de forma tranqüila entre suas várias performances, seja homem, cidadão, pai, irmão, escritor ou médico. Assim me parece.

Como informa a orelha do livro em “Por um fio” está de volta o narrador cuidadoso de “Estação Carandiru” (Companhia das Letras, 1999, 302 páginas), obra que também virou filme (2003) e que conta histórias reais, põe o leitor diante de questões delicadas e difíceis, mesmo para quem lida com elas em sua rotina profissional. O livro desmistifica a doença e, apesar de ter histórias tristes que em sua maioria terminan com a morte de seus personagens, não angustia o leitor.

Em determinado momento Drauzio Varella diz o seguinte, ao refletir sobre sua profissão: “custei a aceitar a constatação de que muitos de meus pacientes encontravam novos significados para a existência ao senti-la esvair-se, a ponto de adquirirem mais sabedoria e viverem mais felizes que antes, mas essa descoberta transformou minha vida pessoal: será que com esforço não consigo aprender a pensar e a agir como eles enquanto tenho saúde?”. Esta é uma pergunta que talvez, imagino, devesse ser feita por todos nós.





quinta-feira, 22 de julho de 2010

VIOLÊNCIA


Além de vir em busca do sol e da proximidade com a família, um dos motivos que me fez escolher João Pessoa como minha casa, foi fugir do agito e da violência de Sampa. Ledo engano! Já sofri mais com a violência por aqui do que em minhas aventuras nas terras paulistanas. Depois de um período aparentemente tranqüilo, a violência voltou a me encontrar em duas tentativas de assalto em menos de um mês. Acreditem, não sei exatamente porque, acabei reagindo ao dois e... como podem ver, ainda estou viva, graças a Deus. Loucura sei que é, mas quem manda na razão sob pressão? Como diria o Chapolim Colorado, e agora, quem poderá me ajudar?

terça-feira, 20 de julho de 2010

BARACK OBAMA


Com todos os conceitos formados pela mídia, parti para a leitura de “Barack Obama – A origem dos meus sonhos (Gente, 1995, 449 páginas)”. Desconfiadíssima, porque mesmo gostando de biografias e memórias, ou coisas do gênero, costumo ficar com o pé atrás diante de narrativas em primeira pessoa. Imagine então com um nome que é quase unanimidade. Advogado, 48 anos, 44º presidente dos Estados Unidos (o primeiro afro-americano), Democrata e ganhador do Prêmio Nobel da Paz. Casado com Michelle, também advogada, pai de duas meninas, tem um cachorro chamado Bo.

A primeira coisa que este livro faz é desconstruir o mito, no bom sentido. Alguns parágrafos, e a imagem pública e midiatizada de Barack Hussein Obama, o fenômeno, é esquecida. Em seu lugar surge um personagem para lá de interessante. Ele revela detalhes de um menino com uma história de vida totalmente diferente da maioria negra americana, que se transforma na grande aposta de renovação política dos Estados Unidos. Nascido da miscigenação de raças e culturas, com uma mãe branca norte-americana (antropóloga), pai negro africano, economista nascido no Quênia, e padrasto asiático (Indonésia), ele se transforma em um líder unificador, alguém que consegue transpor a barreira racial. E este livro narra principalmente essa transmutação, como aquele garotinho ‘diferente’, nascido em Honolulu, se transforma em um potencial grande líder mundial. Descreve o fenômeno de fazer parte de dois mundos distintos, ao mesmo tempo não pertencendo a nenhum, o que ele chama de “meus múltiplos mundos”.

Particularmente acredito que a narrativa torna-se especialmente rica quando Obama decide retomar suas origens. Isso acontece após já ter se formado em Ciências Políticas e ter trocado bons empregos pelo trabalho comunitário, quase uma fixação para ele. Ao chegar ao Quênia, para uma visita aos seus familiares e antepassados, ele sente que pertence a algum lugar. “Dei-me conta de que isso nunca acontecera antes: nem no Havaí, nem na Indonésia, nem em Los Angeles, nem em Nova York, nem em Chicago. Pela primeira vez na vida eu sentia o conforto, a firmeza de identidade que um nome pode trazer, como ele pode carregar uma história nas lembranças de outras pessoas”, afirma Obama.

Nessa volta ele reconstrói seu conceito de família, envolvendo o leitor em suas descobertas. Passa mais de seis meses nessa convivência, que vai muito além da mera formalidade. Sua necessidade de pertencer vai sendo alimentada à medida que histórias são contadas e compartilhadas. Em alguns momentos a narrativa torna-se tão envolvente, que podem acontecer coisas estranhas, como por exemplo, levar um susto ao ouvir o celular tocando, bem no meio de uma narrativa que se passava no interior do Quênia, onde Obama visitava a avó paterna. Um choque de realidade. A avó conta muitas aventuras do seu pai, talvez a maior delas ter conseguido ser um dos raros casos a se formar no exterior, graças ao conselho de seu pai (avô de Obama), que dizia ser “o conhecimento a fonte de todo o poder do homem branco”. O Quênia foi colonizado pelos britânicos.

Barack Obama não é dogmático, planfetário ou sentimentalista. Ele parece um homem comum, que decidiu ter pleno domínio de sua história e de suas escolhas. Ás vezes quase ingênuo, outras vezes naturalmente inteligente e cativante. Coisas do destino, coincidência? Acabando a leitura, eis que surge à minha frente o DVD “Escolhido pelo Povo: A Eleição de Barack Obama”. Vamos lá, ação!