domingo, 30 de setembro de 2012

CATIVEIRO

ou a arte de se divertir com a desgraça alheia


Parque Arruda Câmara (Bica), João Pessoa

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Quando criança, visitas ao Zoológico e ao Playcenter me tiravam o sono. Adorava. Às vezes não me falavam do passeio com antecedência, para ver se não enchia tanto o saco perguntando: falta muito? que dia é o passeio? Hoje, o saudoso parque fechou. E visitas aos parques com animais me embrulham cada vez mais o estômago. Sinto que a garotinha que cismava em não comer os ‘amiguinhos’ tornou-se menos tolerante.

Parque Arruda Câmara (Bica), João Pessoa
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Entretenimento e alegria não combinam com o olhar melancólico de alguns bichos em cativeiro. Uma perspectiva diferente e inquietante sobre o cotidiano de criaturinhas que nasceram com o triste destino de representar a espécie. Tem como negar que algumas imagens mostram a falta de liberdade presente no cotidiano destes animais? Ao que parece, os olhos são mesmo o espelho da alma.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

VIVER PARA CONTAR

A vida não é a que a gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la

Divulgação
Viver para contar (Record, 2002, 474 páginas) é o livro de memórias do escritor colombiano Gabriel García Márquez.  Curioso começar sua leitura exatamente na semana em que foi divulgada a notícia de que Gabo, como é carinhosamente conhecido, sofre de demência senil.  Aos 86 anos ele preparava a segunda parte de sua biografia, mas após o diagnóstico já anunciou que para de escrever. Triste. Um homem tão rico em memórias e histórias silenciar. É a vida. Narrativas e personagens são reflexos de suas experiências. Seu cotidiano já parecia pedaço de romance. O realismo mágico sua trajetória. Tudo se explica. O autor de Cem Anos de Solidão (1967), O Amor nos Tempos do Cólera (1985) e ganhador do Nobel de Literatura (1982) afirma que  “não há nada deste mundo nem do outro que não seja útil para um escritor”.
Todo texto tem seu marcador, e nesse caso ele veio do Museo
Del Prado (Madri), presente de uma amiga querida.
(que emprestou o livro!)
Mesmo confessando dificuldade com a ortografia, perseguiu a escrita como uma religião. Todas as energias estavam concentradas a fundo na obsessão de aprender a escrever. Ele se obrigava “uma carpintaria diária para aprender a escrever a partir do zero, com a tenacidade e a pretensão enfurecida de ser um escritor diferente”. Um discurso tão distante da pretensão do mundo moderno, quando qualquer linha escrita já tem intenção de best-seller. García Márquez é personagem apaixonante. E a partir de agora fica a curiosidade para descobrir em seus escritos traços de suas histórias. Ele confessa, como bom (típico) leitor, o hábito de cheirar as páginas de todo livro novo. A voracidade dos seus hábitos de leitura desde a infância, e a sua coragem de seguir um sonho já o denunciavam. Ele seria grande. Um dos melhores no que sempre amou fazer.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

RUTH CARDOSO

MULHER, ANTROPÓLOGA E PRIMEIRA-DAMA (POR ACASO)

Divulgação
Nunca fui muito de ídolos, mas na adolescência já era fã do antropólogo Darcy Ribeiro. Depois Florestan Fernandes, Roberto DaMatta, Ruth Cardoso. Esta última, quase me fez optar por cursar Antropologia, como minha segunda opção de graduação. Escolhi Radialismo, no último minuto do segundo tempo. A admiração continuou. O objeto de estudo dessa ciência me encanta. Costumes, crenças, hábitos, gente, enfim. Daí a felicidade ao ganhar de presente o livro Ruth Cardoso: Fragmentos de Uma Vida (Globo, 2010, 300 páginas), escrito por Ignácio de Loyola Brandão. Segundo a orelha da obra,Loyola escolheu uma narrativa a muitas vozes, colheu o testemunho daqueles que com ela viveram sua aventura, dos que a amaram. Em depoimentos emocionantes eles reconstroem o que foi o seu percurso de filha, namorada, esposa, mãe, avó, dona de casa, antropóloga, acadêmica e feminista. Primeira-dama do Brasil. Ruth emerge deste livro com o que foi a sua marca ao longo da vida: a busca da excelência em tudo que fez.”

O texto agradável de Loyola em muito contribui para a leveza do livro. Mas a personalidade marcante e acolhedora da “Dona Ruth” é decisiva para encantar o leitor. Sei que comigo foi assim. Ao final do livro estava íntima, participando de uma vida que não mais existia. A ponto de diminuir o ritmo da leitura, evitando chegar ao capítulo de sua morte. Sempre tão empolgada com seus projetos, realizadora, inteligente e bem-humorada, Ruth Cardoso é uma daquelas pessoas que vai embora, mas deixa saudade. Idealizadora do programa Comunidade Solidária, foi uma antropóloga para quem as comunidades observadas eram comunidades vivas e não culturas para consumo das elites.

domingo, 23 de setembro de 2012

DOMINGO

 























Dia de saudade. Da turminha do outro lado do mundo (mesmo depois de uma longa conversa ao telefone). De meu primo querido (depois de 30 dias de ausência). De tempos que não voltam (mesmo não querendo que voltem de verdade). O momento é agora, sempre será (e isso pode ser assustador). O certo é que o tempo passa, e para ouvir o maravilhoso álbum Secos & Molhados tive que recorrer à modernidade. Meu velho LP comprado na lojinha da Continental/Chantecler (Gravações Elétricas S/A), vai continuar na estante enquanto a velha vitrola estiver com a agulha gasta. Vem daí outra saudade, dos tempos da Av. do Estado, onde a também velha gravadora, a última com capital nacional, resistia bravamente. Bons tempos, bom trabalho, amigos queridos encontrei por lá.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

LILIA, LILA, LILLA

 


































Era uma vez uma menininha teimosa. Aqui, o registro de uma de suas primeiras fotos. Era um tempo não digital, esses momentos costumavam ser acontecimentos familiares. Contam que nessa ocasião a tal garotinha cismou que só deixaria fotografar-se quando estivesse de posse da bolsa de sua mãe. Por certo, achou que tinha cara de brinquedo. Ela venceu, e foi aí que descobriu os sinônimos. Teimosia combina com persistência e obstinação. A cara de 'pergunta' esconde as lágrimas que convenceram. Ela venceu, agarrou-se ao seu troféu. Chupeta na boca, outro ponto inegociável para a pequena. Depois dessa, teimosia mesmo só quando cismou que seu nome não era o seu nome. Maria. Parecia básico demais diante de duas Marias com nomes compostos, suas amadas irmãs. A solução, rebatizá-la. Lilia, Lila, hoje Lilla, que a garotinha crescida não teve coragem de ignorar um estudo numerológico, presente de uma amiga. Vai que funciona?

sábado, 15 de setembro de 2012

KIKA, A ESTRANHA

Divulgação
E minha velha mania de comprar livros escritos por jornalistas ou que contem suas histórias. Deve ser uma estranha síndrome de identificação. O primeiro livro da jornalista Kika Salvi, “Kika, a estranha – Aventuras e desventuras de uma colunista de sexo descasada” (Geração Editorial, 2004, 255 páginas) é praticamente um desabafo. Exageradamente verdadeiro e desencanado. Desconfio um pouco de pessoas livres demais, fico imaginando que a psicanálise pode explicar essa necessidade de se expor e impor nossas verdades. Bom, mas isso é outra coisa. Leitura leve, Kika narra com muito bom humor, aventuras e desventuras de um mundo machista, enquanto destrói e constrói idéias, conceitos e preconceitos.

 
Segundo a Geração Editorial, a história de uma “jornalista com duas filhas pequenas, que logo após pedir a separação de um casamento ‘ideal’ de sete anos, passou a assinar a coluna de sexo, na revista VIP, da Editora Abril, e a trabalhar na própria redação. Algumas dessas colunas intercalam e complementam a narração do livro. Foi um começo um pouco difícil. Acostumada à vida de 'dondoca', passou por poucas e boas até aprender a ser independente e se mostrar uma profissional de talento”.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

DIA DA PÁTRIA

O pequeno José, um anjinho com 13 dias de vida.





















Ele nasceu no dia 7 de setembro, e se estivesse vivo completaria hoje 50 anos. Estranho alguém que só viveu 13 dias ter essa idade. O pequeno José é hoje um menino senhor, e será sempre lembrado e querido. Acredito que quase 100% das pessoas que conheço imaginam ser mórbido e estranho a foto de um menininho morto. Para mim, sempre foi o retrato de um irmãozinho querido que foi embora e não cresceu com as três Marias. Essa ideia foi um arranjo das pessoas que, diante de uma mãe muito doente após um parto difícil, acreditaram estar apenas amenizando sua dor. Uma lembrança, única em sua curta existência.
 
Além do mais, o que hoje parece bizarrice já foi algo bem natural. Durante o século XIX era comum que as pessoas, ao morrer, fossem fotografadas. Esta atividade se chama Post mortem Photos. Uma espécie de negação da morte e ao mesmo tempo uma forma da família lembrar-se dos entes queridos. Um costume que começou exatamente por causa da alta taxa de mortalidade infantil, quando as crianças morriam sem que a família tivesse qualquer imagem para recordar.